Pintura de Enrique Monraz
Sentia um ar pesado, inchando o cansaço das passadas curtas,
ofegantes da deficiente oxigenação mental. Um estado abúlico, sufocante. De
calor, do calor. De vazio, do vazio. Sempre temera este sentir. E já a saudade
do projeto de si mesma a fazia desistir, sem experimentar materiais novos ou revivificar os que estavam em gavetas dos arrumos das casas que a (de)moram. E
eram tantas! Tantas quantos os seres e as coisas que amava.
E por si e por eles, era urgente reganhar-se. Reforçar o sistema
imunitário espiritual. Harmonizar-se. Limpar os canteiros do jardim
libertando-os das ervas daninhas. Arejar os armários. Sacudir o pó. Dar brilho
aos móveis. Alternar percursos. Deixar as palavras a marinar. Curar mazelas
físicas, as suas e as de outros. Seduzir-se por outros apetites. Perder-se no
sorriso contagiante das crianças. Apalpar a ternura da mão dada, do abraço, do
cantarolar das pessoas em festa. Reunificar memórias de família e cobrir o
corpo com os ramalhetes dos afetos dispersos. Acompanhar a altura das árvores e
deixar no céu encoberto a névoa que a enegrecera. Respirar o visível. Sentir o
batimento cardíaco. Voltar a ver (-se). Encantar (-se). Amar (-se).
Não precisou de mudar de casa, tampouco de viajar. Bastou arejar
(-se). E na frescura deste tempo reganhou a leveza das passadas.
Odete Ferreira – 30-07-15
Adenda em 22-08-2015
Hoje deu-me para me ligar ao Google+. Uma tolice: alterou-me o perfil e todos as publicações e comentários aparecem com o meu nome (Odete Ferreira). Portanto a EU, para já morreu... :(