terça-feira, 25 de agosto de 2015

Da destemperança


Obra de Manuel Casimiro

Controverso este estado
desatento no verso
inseguro nas in-verdades
que ouço.
Mundos de irrealidades
nas bocas dessacralizadas
porque de falsos profetas
saem todas as desgraças.
Analfabeta de sumidades
só sei ler a história contada
gregos, troianos, águas sulcadas.
É no mar que se perpetuam os búzios
e se cumprem os atos de destemor.
Testemunhos erguidos
filhos de sonhos legados
no tempo da esperança…

Desassossega-me esta destemperança…

OF – 13-07-15 

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Tempo de arejo

Pintura de Enrique Monraz

Sentia um ar pesado, inchando o cansaço das passadas curtas, ofegantes da deficiente oxigenação mental. Um estado abúlico, sufocante. De calor, do calor. De vazio, do vazio. Sempre temera este sentir. E já a saudade do projeto de si mesma a fazia desistir, sem experimentar materiais novos ou revivificar os que estavam em gavetas dos arrumos das casas que a (de)moram. E eram tantas! Tantas quantos os seres e as coisas que amava.
E por si e por eles, era urgente reganhar-se. Reforçar o sistema imunitário espiritual. Harmonizar-se. Limpar os canteiros do jardim libertando-os das ervas daninhas. Arejar os armários. Sacudir o pó. Dar brilho aos móveis. Alternar percursos. Deixar as palavras a marinar. Curar mazelas físicas, as suas e as de outros. Seduzir-se por outros apetites. Perder-se no sorriso contagiante das crianças. Apalpar a ternura da mão dada, do abraço, do cantarolar das pessoas em festa. Reunificar memórias de família e cobrir o corpo com os ramalhetes dos afetos dispersos. Acompanhar a altura das árvores e deixar no céu encoberto a névoa que a enegrecera. Respirar o visível. Sentir o batimento cardíaco. Voltar a ver (-se). Encantar (-se). Amar (-se).
Não precisou de mudar de casa, tampouco de viajar. Bastou arejar (-se). E na frescura deste tempo reganhou a leveza das passadas.


Odete Ferreira – 30-07-15

Adenda em 22-08-2015
Hoje deu-me para me ligar ao Google+. Uma tolice: alterou-me o perfil e todos as publicações e comentários aparecem com o meu nome (Odete Ferreira). Portanto a EU, para já morreu... :(