Todo o tempo é diferente. Todo o espaço é diferente. Todos os
lugares se veem diferentes. Como as pessoas. Nada de novo, portanto. Assim como
o tempo, o espaço e os lugares que falam natal, encorpado da semântica, do
significado, das circunstâncias, dos territórios em que é moldado. Como se fora
uma veste talhada para um corpo. De preferência, seguindo as tendências da moda.
O lado visual, atrativo, estilizado: um catálogo a ser vendido, após aturados
estudos prospetivos. E quase tudo vai na mesma direção, num segmento previsível,
terrivelmente sensabor. Após o enchimento dos olhos, quase piscos pelo excesso
das luzes, sente-se o esvaziamento do balão, tocado por um presépio de musgo,
timidamente colocado num cantinho da montra – global – entre a profusão de
laços e laçarotes.
Se assim é, faz sentido
falar de natal? Invocar o natal? Escrever as cores de natal?
Sim, faz! Natal é mensagem e metáfora de humanidade: a sua alma, o
seu imaginário (como um conto das mil e uma noites), a sua magia, o seu sonho,
a sua fortaleza, o seu abrigo. Raiz e matriz. Sentido. Dádiva. Em si, para si e
entre si. Um mandato do espírito, um mandato do amor. Um aviso aos homens de má
vontade, num tempo em que se cultua o umbiguismo (e outros ismos), as reações
timóticas, a frieza (e crueza) comunicacional das redes sociais, postergando os
princípios, ancestralmente herdados, na conduta social, para uma segunda ou
terceira vias – ou mesmo residual: o olho no olho, a mão na mão, a fala, como
processos basilares de entendimento. E é disto que se trata nas falas de natal,
na troca das Boas Festas. De respeito, de boa vontade. De humanidade.
Consequentemente, não podemos deixar de alocar a frase feita:
natal é quando o homem quiser. Então, que (re)nasçam homens e mulheres que
sejam mensageiros de palavras e atos de verdade. E que seja esta a época
inteira em que se renovam os votos, numa celebração milenar, nascedouro de
homens de boa vontade. E que, neste ano de terra queimada, nos penitenciemos
dos natais adiados e irremediavelmente perdidos, em todos os lugares, prometendo
intermediarmo-nos com a única língua entendida por todos: o amor.
Foi verde o nascimento do Menino. Só poderá ser verde o natal de
todos os meninos.
Honremo-lo! Agora e sempre!
Odete Costa Ferreira
Obra de Domingos Sequeira, acervo do Museu Nacional de Arte Antiga
Texto de opinião inédito (Contributo para a atividade proposta aos
associados da Academia de Letras de Trás-os-Montes “Literatura de Natal”,
publicado no blogue da ALTM e na página do FB)
A autora escreve segundo as regras do novo acordo ortográfico