quarta-feira, 24 de junho de 2015

Encontro(s) poético(s)

Dezassete horas de uma tarde quente, abafada. Estrada por minha conta. Casas adormecidas. As terras amanham-se nas madrugadas e nos anoiteceres. Por aqui as horas dos homens não têm sentido. Mas hoje há um sentido para a hora marcada. Dezoito horas. Lançamento do livro de poesia “Raízes Invisíveis” do amigo Manuel Maria Figueira, na Fradizela. É para lá que me conduzo, confortável, saboreando os acordes musicais e esta quietude que me seduz pela imensidão de um silêncio que tanto me diz.
O largo. Diferente. Já com vida. Pessoas carregadas de anos e outras mais leves deles, namoram o fontanário e o espaço arranjado, aprazível  pela conjugação harmoniosa entre o tradicional e o moderno. Recebem-me os sorrisos. Do poeta e o destas gentes. E o encantamento faz-se inquilino do meu sentir. Revejo amigos. Aproximam-se outros. É assim: confia-se. Os olhos olham-se e as almas abraçam-se. Foi neste ambiente autêntico, com o espírito perfumado dos cheiros da terra que o evento decorreu. Mágico. Grandioso na simplicidade. Pleno na afetividade. Fermento a levedar a massa poética de um povo atento e exemplar na postura que adotou ao longo desta festa cultural.
Apresentar a obra poética para um auditório que bebia cada palavra proferida, engrandeceu-me, honrou-me. E o poeta mereceu. Pela poesia que materializou em papel e pela pessoa que é. Obrigada, Manuel, por me concederes a oportunidade de viver momentos ímpares. E não preciso de desejar sucesso ao teu livro. Vê-lo nas mãos das gentes que fazem parte das tuas raízes está para lá do sucesso. E, estou certa, será destas raízes que continuarás a extrair o suco poético que farão germinar os poemas que te são vida.

Odete Ferreira, a propósito da apresentação do livro “Raízes Invisíveis” de Manuel Maria Figueira, em 20-06-2015, na Fradizela, concelho de Mirandela 
A mesa: o poeta ao centro, parecendo fazer parte da capa do livro
Apresentação do livro


Panorâmica do espaço e auditório
 Fotos de Humberto Rodrigues

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Surreal XXVIII

Gosto de alimentar as nuvens
e de as ver num mutante colorido.
Movimento de vida.
Eterno celeiro do sonho.
Por isso as alimento
nos olhares que lanço
embebidos nos diferentes estados
sólido, líquido, gasoso.

OF 05-07-14 

quarta-feira, 10 de junho de 2015

O Tempo e o Homem


Num qualquer lugar,
num tempo filho de pais incógnitos,
deserdado de rosto identificativo,
nasceram olhos de voos
ignorando o mito do pecado.
Ovos chocados de intempéries devastadoras,
campos de batalha onde
espermatozóides da vergonha
se calaram e outros se ousaram
na fecundidade do pai sol
e no ventre de uma lua feiticeira.

Não sei do tempo da viagem,
tampouco de descobertas galáticas
ou (e)videntes seres de olhares visionários.
Sei de histórias de sobreviventes
contadas ao luar coado do telhado
e pelo homem do saco que descia
chaminés escurecidas das fogueiras.

Sei deste tempo e de tempos nascedouros de homens.
Imperfeitos na penumbra de manhãs redentoras.
Selvagens na poeira das cavalgadas desenfreadas
permitiram outro tempo,
a liberdade de procriar humanidade.
Sabiam que não era o paraíso,
pelo menos aquele de que ouviram falar.
Permitiram o veneno mortífero
de atos e omissões inconfessadas.
Mas pediram ao Tempo que revogasse
as leis de infortúnios letais.

E deixaram que os pássaros seguissem viagem…

OF – 11-05-15  - Pintura de Adiasmachado, Arnaldo Macedo e Adriana Henriques
(Poema escrito a partir desta pintura para a 2.ª edição de "As Cores da Poesia")



terça-feira, 2 de junho de 2015

E continuamos pequeninos!


Obra de Pablo Picasso

Dizem-me da tua solidão.
Sentado no teu canto.
Supostamente em contramão
do rebanho que se confunde
na obscuridade de um tempo nebuloso.

Duvido dessa solidão.
Sei da tua sensibilidade,
do teu olhar mar,
da tua faminta curiosidade,
do recolhimento embevecido
na sapiência do Mestre.

E ficas tão pequenino!

Contradigo essa solidão.
Procuro dispersar as ovelhas.
Encher-lhes as orelhas de espanto.
Baralhar os caminhos.
Soltar as represas.
Fazer enxergar o miudinho.

E fico tão pequenina!

Acrescento-me nessa solidão.
Das árvores conhecemos os ramos.
Teias intrincadas de saberes.
Dos horizontes sabemos nada.
Universos mágicos para lá das nuvens.
Sentados, de mãos dadas, sonhamos utopias.

E continuamos pequeninos!
OF- 12-11-14