sábado, 25 de abril de 2015

Nem te renego nem me nego

Obra de José Malhoa

Saberão um dia que não te renego
mas não nego que estou como em tempo de cheias.
Transbordo a irritação para lá das margens
escabelando a voz meiga da cegueira.

Nem sequer tenho escapatória,
as eclusas são demasiado apertadas
e tudo fica neste interior ensimesmado
Um deserto sem areias, nem espaço voador.

Asfixiam-me as notícias poluentes
que matam seletivas células de esperança.
Ainda ontem dizia que era feliz.
Mas como o ser na destemperança do outro!

Ai meu país de oásis benditos semeado.
Tanta cor, tanto odor, tanto amor.
Vejo, cheiro e afogo-me na bebedeira dos sentidos
de em tanta água lodosa mergulhar.

Corre mansa a água do meu rio
e este sol afogueado que o degela
prenuncia um ciclo novo de palavras.
Só não sei em que tempo a história será escrita.

Mas não te renego, país de poetas desconhecidos.
Trairia os versos apaixonados que inspiras.
Na força do vento espero tempestades varredoras
de gente vil! Sim , essa que te atraiçoa!

No fim, será sempre o povo que jurará bandeiras!

OF – 30-03-15 
(Imagem retirado do google)

quinta-feira, 16 de abril de 2015

Há momentos... Na Hora da Poesia...

Há momentos em que a luz é mais luz. Conforme o escuro dos espaços. Conforme a luminosidade do olhar, ou a das cores. Só sei que me ocorre ser um pirilampo maior, diferente de qualquer outro pirilampo. Só porque o brilho que sobra de mim, acrescenta-se no outro. E fundem-se. Talvez seja este o estado puro da cumplicidade, da partilha na paridade do respeito. E este define-se na postura de cada um, um estar de humildade e um ser de gratidão. Balizo-me entre estas linhas. O campo do jogo delimita-se conforme a proporção das jogadas. Mas na baliza faz-se a triagem.
(…)
Aconteceu um momento de luz. Na crença de que ela se prolongará pelas almas amantes das palavras e da vida, surge este apontamento. Por estes dias, passados que são quase quatro anos do nascimento do meu “Em Suspenso”, dou-me conta que a forma até pode ser outra, mas a essência de mim mantém-se no escrito. Já assim reza a dedicatória “Para almas que fazem da vida a sua poesia…”

(Um grato sentir emotivo pelas intervenções em direto da amiga Ana Bárbara  http://anabsantoantonio.blogspot.pt/2015/04/agonia-para-odete-ferreira-saber-te-tao.html e do amigo Filipe Campos Melo http://porta-sonho.blogspot.pt/ , assim como pela presença em estúdio do casal amigo Alice Queiroz e Rogério Barbosa - as flores vêm de uma flor única, a Alice...)

                                        


Fotos: Rui Simão

Convidada – Odete Ferreira – 08-04-2015 (Clicar no link para audição):


Nota: semanalmente, à 4.ª feira, 21H, a inigualável Conceição Lima, em cerca de uma hora, divulga poetas desconhecidos, resgata outros ou faz a revisitação dos que “da lei da morte se vão libertando” – como dizia Camões nos Lusíadas, Canto I, 2.ª estrofe. É A Hora Da Poesia, um programa a não perder...


OBRIGADA, Conceição Lima, PARABÉNS, Rádio Vizela

Odete Ferreira – 11-04-1

Há momentos que atravessam o tempo
num coletivo de húmidos sentires.
A chuva gotejada que se anuncia.
A espera sossegada no sorriso.
O de(lei)te em estado puro.
Almas em onda sintonia.
Na rádio, a hora da poesia,
há um nome granítico
dos voos ousados apanhando
a nudez dos pássaros e
São, no verbo do seu nome, libertados.

Há um Porto que me é abrigo.
Abraço poético de palavras enternecidas.
Estreitos olhares para tanto infinito
podendo ou não desaguar no mar.

Mas é da boca que sai o suspiro
já saudoso das horas vivas
e de marés que me fugiram
no tempo que não me é devido.

Sempre tenho o tempo do grito,
o tempo por momentos repartido.
Sem a cadência do ritmo
em horas de poesia adormecido.
Encontram-se os tempos no momento,
horas raras na correria do pensamento.

Depois há vozes revoltas
que abraçam o mundo todo. 
São águas de rio selvagem,
de um outrora fazem o agora,
de poetas, de poemas, de horas da poesia. 

OF – 10-04-15 

terça-feira, 7 de abril de 2015

Perto do céu

 Obra de Pierre Auguste Renoir

Tenho um mar muito meu
que vai para lá do imaginário
e me inunda sedutor o olhar.
(Sei de feitiços perpétuos em olhos incautos)

Ondula sereno afagando caules cerealíferos.
Tinge-se de cores naturais.
Espreguiça-se ao alvorecer
antes de ouvir cantar o galo
e dos homens chegarem.

Ausente de perturbações emocionais,
acolhe com o mesmo sorriso a bonança e a tempestade.
Engravida vidas sempre a acontecer
nos ciclos prometidos e por forças insondáveis regidos.

Copula-me este sentir desmedido.
O pão e o vinho da comunhão
num vasto altar de rochas dúcteis.
Esvaio-me em húmidos ais
esmagada na vastidão do silêncio
desta paisagem que me trespassa.

Resta-me a vassalagem
a mares de ondas verdes
onde pontilham o vermelho das papoilas,
os amarelos das giestas, os cinzentos das invernias.
Onde se ouvem cantatas livres
as dos pássaros em voos rasantes.
Neste mar muito meu
avanço no caminho do meu eu.
Sei-me verde. O azul pertence ao céu.

OF – 24-02-15 

Adenda em 07-04: Amanhã dia 08-04, pelas 21H, estarei na Hora da Poesia, nesta rádio: http://www.radiovizela.pt/