Um pai e sua filha, suponho, pisando delicadamente o relvado. Apercebo-me que usa óculos, a esta distância pouco mais poderia reter. A menina sim. Terá uns cinco/seis anos. Não mais; meias já quentinhas, uma saia curta, um casaco rosa. Já com alguma pose, deliciava-se a acariciar a relva com as suas botinhas, retardando o passo, vendo-se que o pai a ia arrastando...Parecia que não queria andar. Lembro-me que o meu filho me fazia um exercício deste género quando preferia ser levado no meu colo. Mas o seu peso já fazia doer as costas e queremos sempre inculcar a autonomia, entendemos este género de atitudes como preguiça. Mas será mesmo? Hoje questiono-me. No tempo dele já havia carrinhos, de longe um arremesso aos que há de tão sofisticados. Dava por mim a levar o meu filho ao colo e a arrastar o carrinho, pois o choro esfaqueava-me a alma.
Ontem, num dos grupos de discussão do FB a que estou associada "Se as crianças falassem", havia uma postagem do principal mentor (deduzo) desta página. Postagem tocante, valia a pena reproduzi-la mas nunca publico nada de outrém para a qual não tenha solicitado autorização. Sou visceralmente contra a apropriação intelectual. A postagem teve inúmeros comentários. O caso não era para menos. Ao fim de 3 anos e pouco, voltou a estar com a filha de sete anos e partilhava, em meia dúzia de linhas, esse reencontro.
Ligada que estou, por profissão e outras funções, a crianças e jovens, qualquer situação em que os progenitores não sejam capazes de separar as águas, no caso da finitude do relacionamento, causam-me enervamento. Há tanto a mudar na legislação, celeridade e acompanhamento efetivo nesta matéria!
Toca-me de forma particular quando um pai luta pela guarda do filho/a, assim como o bom relacionamento de que me apercebo em muitos casos, alargando este conceito à partilha, à cumplicidade. Chega a emocionar-me!
Por cá ainda está muito enraizada a tendência de a atribuir à mãe, Sei, cada caso é um caso. A regulação das competências parentais tem que ter um dos dois à cabeça mas, cada vez mais, ambos são chamados a tomar decisões conjuntas em matérias fulcrais para o desenvolvimento e formação do ser, pertença de ambos para sempre.
Já vai longa esta "crónica". Não pensava escrever sequer sobre este assunto. Bastou ter reparado num pai e sua filhota, no final de uma manhã cinzenta, já fria, seca atmosfericamente, mas bem regadinha de afetos. Podem não ser os meus, mas, em tempo de crise, são ainda o que temos gratuitamente. Basta acreditar em algo que não se vê, a alma, e em algo que pulsa e dá vida...Coração...
Odete Ferreira 27-11-11