domingo, 28 de dezembro de 2014

Do exato momento da Viragem


Obra de Daniel Castro

Amplio o olhar. Traço-o numa escala de inalcançável dimensão. Pelo menos terrena. Pelo menos à medida do magro conhecimento que possuo sobre as leis do Universo. Mas tenho uma mente cognoscível de palavras dispostas em tabuleiros de jogos imprevisíveis. Alguns, sei que vou ganhar. Outros, provavelmente a maior parte, serão a roleta que ora se aproxima dos números da sorte, ora se trapaceia para rir do azar. Sorte e azar! Tão ténue o limite. Como amar e odiar. Como viver e morrer. Como… o hoje e o amanhã, como a fragmentação do tempo em horas, minutos, segundos.
Marcas visíveis na invisibilidade de uma simultaneidade temporal que só o pensamento domina. A uma velocidade imensurável. Tento retardá-la para resgatar momentos. Tento acrescentar alguns dados de previsibilidade, tão só para sustentar os desejos para o novo ano. No exato momento da VIRAGEM.
Consciente desta impossibilidade, será a emoção pelos amores maiores que me tomará, levitando-me na semântica do sonho.
E é por ela que sorrio enquanto me borbulho no champanhe do momento.

Odete Ferreira (OF)

Acompanhar-vos-ei num brinde a um ANO mesmo NOVO! A não ser assim, 2015 será apenas mais um que enfeitará paredes (des)lavadas da esperança que vai esmaecendo…Haja crença!

segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Semeio-me de Natal


Obra de Frida Kahlo

É o adubo que me fermenta
crescendo em sementes minhas.
Rebentos de remotos milagres
ainda que estéreis sejam as raízes.
Mas há uma pródiga terra
insaciável de alimento.
E abraça em mudo silêncio
o universo das provisões.

E sou a Terra e Universo
embalando o berçário de incógnitas multidões.
  
E é no verso precocemente parido
que alongo o meu sentir
vertendo em cada palavra
gotas sequiosas de sedes.
De abraços. De beijos. De amplos sorrisos.
Mas há versos desprovidos de sentido
se esconderes o sol nas heras dos muros
e às estrelas lançares feitiços malditos.

Então nada será renovado.
Tempos, espaços, ciclos finitos.

Acontece encantar-me olhares de reencontro.
E pessoas ligeiramente curvadas
nas figuras atrativas desta época.
Boas Festas desejadas, pretexto do afeto
faltoso em tantos dias do ano…
E neste trilho colho ramos de azevinho.
Inseparáveis o verde e o vermelho
é esta a natureza de oferta e união.

Assim permito-me semear
sementes minhas em terras sedentes de criação.

OF - 17-12-14

Acho que bastava o poema. Contudo, também não será redundante desejar-vos uma ótima quadra natalícia. Que os valores do humanismo digam presente neste Agora e para todo um Sempre. Como acontece encantar-me olhares de reencontro, espero-vos de sorriso amplo :) :)

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Sonos de sonho


 Obra de Enrique Monraz

Sorriste. Todas as palavras que havias sussurrado na loucura do momento. Parecia acudirem-te e o riso estremecia músculos atordoados. Abraçaste os braços nus. Começara a sentir-se um frio saudoso das cores outonais. Tanto lamentas a velocidade do tempo que queima as horas em que não estou. Paradoxal, o desejo do anúncio de um novo ciclo pela natureza que acorda e impulsiona a tua vida. Sabes, não me surpreende. Sinto até uma ternura que te devolvo, massajando com as pontas dos meus dedos as marcas do sol. Também de neve! A luminosidade prega destas partidas: olhos semicerrados, encolhendo a pele. Guarda-sol do olhar. O olhar que me ilumina no escuro ausente de luar.
Como te amo nesses momentos! Nem sei descrevê-los. Apenas os sinto em cada ínfimo de diâmetros que delimitam o meu corpo. Mas deve ser na alma que repousam do cansaço emocional. E é aí que retorno sempre que preciso do teu alimento. Não mato a fome, como diz a Maria. Adio-a até ao próximo momento. É sempre no escuro que sugo o teu sangue quente, fonte da paixão que faz rebentar as entranhas da terra.
Quando formos pó, todos saberão do local escolhido onde o amor se reproduzirá, fazendo nascer as rosas vermelhas que me oferecias. Serão delas as primeiras saudades. Desses momentos. Da intensidade sísmica que o nosso tempo trazia à terra árida de humanidade.
(…)
No final, ninguém distinguirá marcas. É apenas terra, sustentando as cores florais…

Odete Ferreira – 20-09-2014

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Não te abandonarei


Obra  de Thomasz  Alen Kopera

Abandonaram-te?
Ecoa sofrido o pio,
asas aparadas de tortura.
Já não voas.
Apenas as ilusões óticas
de mundo perfeitos
te identificam como pássaro.

Saltitas despercebido.
Da postura outrora garbosa
poderá fazer troça
qualquer galante rosa.

Refugias-te nas tocas do restolho
onde te sentes mais igual
à feiura do povo.
Curvado, encurvado
e retorcido pela força do fogo.

Foi por ali que te vi.
Dócil, amedrontado o bico
que sei, erguias repenicado.
Resisti a mais uma gaiola.
Sempre terás a imensidão
do grito de uma terra
golpeada a subtis machadadas.

Não te abandonarei!
Pela noitinha te alimentarei.
Penso ser a melhor hora
de me mostrares o caminho.
Preciso destruir o ninho
…das bestas…

Não te abandonarei!
Dizem que a justiça é cega.
Nos meus olhos cega-me a cegueira dos injustos.

OF- 23-10-14 

domingo, 30 de novembro de 2014

Reinventar momentos



O espaço prepara-se devagar apesar de mãos afadigadas.
Há urgência no desnudamento das árvores. O inverno, já cansado do cerco outonal, das cores fulgurantes de paixões acesas, precisa depositar o sémen branco em cópula de amores calmos. É o seu tempo. É a sua natureza. Sabe que, daqui a uns meses, nascerão rebentos esperançados no verde da terra.

Entretanto, há mãos doces que se deleitam no alisamento da rugosidade das folhas: umas imaculadas, resguardadas em espaços abençoados, outras espezinhadas nos caminhos palmilhados -  há sempre mortes ainda que involuntárias.

Mas o espaço prepara-se devagar. Pincelado aqui e além. Sem surpresas. As cores de mãos afadigadas libertam o vermelho e o dourado. As formas são recriadas. Já nada há a reinventar. Acredito que apenas o espírito. Esse todos os anos se sente diferente. Irrepetível, ainda que os gestos se façam iguais e da boca saiam palavras desgastadas pelo uso.

Na causalidade das coisas será a alma a reinventar os momentos. E é neste espírito que preparo o espaço. Devagar. Tenho tempo. Só amanhã será dezembro… 


Obra de Lula Cardoso Ayres
Odete Ferreira (OF)
30-11-2014

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Momento(s)


Obra de Pawel Kuczynski

Momento(s) - XXX

A vida aparece de sopetão.
Engano nosso se pensamos tê-la na mão.
Por isso os caminhos são tão sinuosos,
preguiçosos,
sorrateiros,
matreiros.
Raposas de orelhas arrebitadas,
rindo a bandeiras despregadas
quando o corpo marca marcas zangadas.

Raiva centrifugada
num processo mental.
Escorre liquefeita
enformada numa alma
depurada da maleita.

E segue-se outro caminho,
diferente do indiferente
mundo de verbal diarreia…

OF, 27-06-14  

domingo, 16 de novembro de 2014

Tens o milagre na mão


Obra de Hélio Schonmann

Tens o milagre na mão,
gesto de ternura efusivo,
queima-te o rosto já tisnado,
pedaços de sol escondidos
espelhada terra dos teus sentidos.

Sentes a raiva da ausência.
Da flor, do aroma, do sabor.
Do fruto, do tato, do amor.
Mas tens o milagre na mão!
Alongas-te no mágico infinito
e sacias a flor e o fruto proibido.

Procuras a sereia na seara.
É o mar que te entontece.
Vês  azul no lugar do verde.
Mas tens o milagre na mão!
Sulcas um leito de espigas
e na sereia adormecida te deitas.

Palmilhas trilhos de desejos.
Caminhante de cajado calejado.
Páras cansado de insanos ensejos.
Mas tens o milagre na mão!
E dos trilhos fazes caminho
direto, tela retocada do teu paraíso.

Tens o milagre na mão…
Beijas o sol íntimo amigo.
Acaricias  o ventre de lua cheia.
Apascentas o rebanho de estrelas.
Teces poemas nas tardes demoradas.
Acolhes o repenicado pio da passarada.
Tocas o piano da natureza matizada.

…E no milagre da tua mão
prendes a musa sedução…

 OF –  30-05-14

sábado, 8 de novembro de 2014

Perfil


Obra de Edward Munch

Gosto do teu perfil. Vasculho numa gaveta da mente algumas peças com que o possa vestir. Mas os adjetivos já estão gastos e quase em pó. Parece que foi a traça. Não arejei o suficiente. E foram-se evaporando, caindo nas mãos de quem deles precisava. Por isso, não te posso adjetivar. Ficarás a pairar no limbo do incognoscível.
Mas o leitor é sempre um  voyeur de palavras. Atira-lhes um olhar sorrateiro, primeiro, mas depois é mesmo descarado: vocifera quando não faz uma pálida ideia de ti!
E que culpa tenho eu?
O verbo, o verbo é que te incorpora. O teu perfil é um verbo. Mais precisamente verbos e neles me enredo. Pensas, ages, falas, aconselhas, enrijeces, enterneces, perscrutas, indagas, sentes, despes e amas. Sem ordem, sem prioridades. Simultaneidade! Talvez consiga percecionar tonalidades no teu perfil. Mas deve ser da luminosidade do momento. Ou da minha visão distorcida, permitida pelo caleidoscópio em que a minha alma te revê e te vê.
És um perfil verbal, mesmo quando fazes o teu caminho. Intenso de odores que foste aspirando em todos os seres vivos. Por isso te cumprimentam quando medes os passos. Não pisas. Danças na brisa da magia dos instantes.
Perfil enigmático que vai para lá dos séculos. Como o universo. Como o sorriso da Mona Lisa.
E, tal como tu, fundo-me na simultaneidade dum tempo impreciso, algures num espaço rarefeito.

Odete Ferreira – 08-07-2014

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Resgate


 Obra  de Paul Cézanne

Amanheceu-me um sono friorento.
Faltou-lhe o desejado agasalho.
Nessa noite escura e de tormento,
que tentei pendurar no verde galho.

Não tendo conseguido tal intento,
no sonho aparecias magoado.
Prostrada, passiva e sem alento,
vagueava o olhar atormentado.

No quarto apertado senti o cheiro.
Terra húmida de fortes chuvadas.
Natureza irmanada em calafrio.

Não sei de teu errante paradeiro.
Procuro-te no meio das levadas.
P´ra te resgatar aquém do meu rio.

OF- 13-10-14

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Vazios


Obra  de Edvard Munch

Espaços transparentes nos olhos – vazios.
Sensações angustiantes nos corpos – vazios.
Tempos indiferentes nas horas – vazias.
Sentidos errantes nas mentes – vazias.

Sem chão,
sem caminho,
sem companhia…
Palpável é o vazio
da emoção,
do carinho,
da invernia.

É o olhar que percebo na tua cercania,
nas charnecas lodosas,
nas águas que se agitam gulosas,
soando a elogio fúnebre,
que te entendo, solidão,
perdida na multidão lúgubre.

Puro estado liquefeito,
centrifugado na solidão da insensibilidade.
Ar irrespirável e rarefeito,
como leprosa, esfumou-se a solidariedade.

O gesto chega sempre atrasado.
O doente já bem debilitado,
do desafeto expirado
não percebe que a hora havia chegado.

Há tanta enfermidade
enconchada no vazio
da suposta humanidade…

OF- 15-10-14

domingo, 12 de outubro de 2014

Dia de raízes


Ontem foi dia de raízes. De as cortar. Uma fileira de pinheiros que cresceu conforme a lei da natureza. Alto porte apesar da estreiteza do canteiro ao longo do lado poente da casa. E, mais frágeis, os cubos de granito não resistiram a esta investida. Raízes são raízes. E ainda que se corte aqui e além, a verdade é que fazem o seu caminho, enraizando-se por tudo o que puder servir de suporte no cumprimento do inexorável destino. Uma praga a que a minha incúria mental foi cega, surda e muda. Predadoras de revestimentos. Têm razão. As raízes são assim mesmo: livres, autónomas, sem dono e pátria. Não dependem de amos. A terra e a água bastam. E nisso é pródiga a natureza, embora a água não seja tão democrática na sua distribuição…
Minimalistas na decoração da sua casa. Já nascem edifício, de labirintos entrançados. Talvez queiram mesmo que nos percamos por lá! Teimamos em ignorá-las. Pensando vencê-las. Uma tontice! Somos tão frágeis  como qualquer material que se use para caminharmos mais seguros. A natureza é lei. Por que teimamos em desobedecer? Talvez devessemos voltar aos caminhos de terra batida. Chafurdar na lama. Purificar a alma.
Há algo em mim que se vai livrando de raízes, desprendendo-me de tanta coisa material. Coisas, apenas coisas! Não penso na morte. Em todo o caso, sei que não quero deixar legados pesados. Sim, daqueles que ocupam muito tempo desnecessário aos nossos descendentes. Apenas a leveza do que for essencial.
  
Odete Ferreira – 05-10-2014 
Foto de Odete Ferreira

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Da vida extraímos sinfonia

Obra de Pablo Picasso

Cabe o mundo numa praça.
Lugar ínfimo na grandeza espacial.
Tudo aí ganha sentido.
Por lá se aloja o tempo memorial.

Soerguem-se sem abrigos madrugadores.
Sono entrecortado pela música natural
dos pássaros notívagos
que vasculham sombras carnais
e dos fados soprados por bocas sensuais.

Em ritmo desapercebido faz presença,
o som do ar que vivifica
bonecos de filmes animados.
E eu, protagonista, entoo a música
de um outrora preferida.
Num ápice a praça ganha outra vida.

A cantata vem da fonte.
Verte segredos da bocarra caricatural.
Os amantes repousados
de suores matinais esfriados,
ouvem na telefonia
o amor teclado na noite fantasia.

É surreal esta orquestra
embora os instrumentos sejam visíveis.
Irrepetível em cada dia.
Audível apenas por ouvidos sensíveis
quando por ali passa a música da vida.

E como a música me eleva,
gravo pautas na praça,
danço as notas musicais,
os passantes fazem-me companhia
e ébrios de sons, extraímos da vida sinfonia!

OF, 01-10-14

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Faltou arrojo a este outono


                                                         Obra de Brad Kunkle

Não me fica bem este rio embrumado.
Nota-se escorrendo de minhas faces pálidas.
O vermelho desbota-se no pregueado.
Marcas perenes de noites outrora cálidas.

Vestiu-me esta noite de folhas em recorte.
O sorriso, este sorriso iluminado,
acrescentou-o o sol ao seu fino porte,
num amanhecer pálido e envergonhado.

Procuro o rosto dos sentidos outonais.
Mas cega àqueles indícios subversivos
que, vós, sábia natureza aclarais,
toldam-me somente de uivos compulsivos.

Perdi-te num intenso sonho diluvial
vergastado  pelos deuses da intempérie
ainda não sei se foi providencial,
um outono assassino de almas em série.

Por entre veredas selvagens e estreitas,
quotidiano sem poética visão,
carecem as utópicas cores escorreitas
Um outono velho, tímido de emoção.

Onde pára a natureza que me encantava,
o colorido de telas inconfessáveis,
as encostas macias onde te afagava,
os leitos floridos de segredos palpáveis?

Sei que a resposta está na espera tranquila.
Na paradoxal ânsia de alma intranquila.
Os tons outonais ficaram presos nas filas.
Ergue-te! Faz-te tela nas minhas pupilas!

OF, 24-09-14

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Declinando aplausos

Obra de Vincente Romero

Tardava-se nos pormenores. Vinha-lhe sempre à ideia aquela frase “Sorria, está a ser filmado” e, de facto, nunca saberia em que filme se poderia encaixar. O papel podia ser um qualquer. Só precisava de empenho. Afinal quantas personagens assumiu na sua vida! Reais, imaginadas ou representadas frente ao espelho que estivesse mais à mão. Melodramática, diva da canção, dançarina sedutora, tendo apenas como coreografia o seu próprio nu… Ritual de confiança, incógnito. Fora deste espaço, seria apenas mais uma, no recato que lhe fora atribuído. Por outros. Entalada e enlatada, fazia parte da engrenagem societal. Mas, no invisível do seu ser, soltava demónios que ofuscavam ou talvez fosse culpa dos tais pormenores.
Segura, decidida, tomava decisões num ápice. Fazia acontecer, numa simultaneidade de tempos e espaços, ações que lograram o respeito pela instituição que dirigia. Adrenalina, no seu estado mais puro. Perfecionista, para uns, prepotente, para outros… ora, a verdade é que havia um clima organizacional pautando as suas atitudes pelo respeito que cada um merece.
(…)
Contudo, a distância temporal desobriga-nos. Olha-se de novo para o espelho de outros ângulos, onde a luz assume a sua força na fragilidade de um corpo que vai acusando marcas.
Continua segura, decidida. Tem consciência dos seus momentos. E daqueles em que marca encontros a sós, sentindo todo um palco  dentro de si. E dispensa aplausos…

Odete Ferreira, 18-05-2014 

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

No céu da minha boca



Pintura de Isabel Alfarrobinha 

Na ubiquidade do teu ser laranja
sumo escorrido que sara feridas,
cinjo num olhar fugidio
múltiplas faces figurativas.
Tela fugaz, memória,
momentos de glória
no céu da minha boca.
Amorangados
alaranjados
acerejados,
tons pincelados
pela fúria de beijos.

No céu da minha boca
floresce um campo novo
sabores ainda no mosto
sumo de ondas de um sentir bravio
dissolvido na areia intumescida
espuma de espasmos que sinto
na maçã que trinco…

OF -  27-01-14 

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Entardece o tempo, meu amor

Obra de Richard S. Johnson

Entardece o tempo, meu amor,
na espera das rosas
a crescer no corpo do desejo
ou dos cravos a fervilhar a paixão.
Nos olhos cravejados de emoção
que a alma verte,
deixando minúsculas pocinhas
na pele ardente,
sinto especialmente
a erosão das horas,
o vazio do espaço
quando me faço ao caminho.
E ranjo os dentes ao tempo
que nos entardeceu.

As rosas esmagadas se deixaram
no abraço desejado, premente.
Mas os espinhos dilaceraram
a boca do silêncio para sempre.

De novo, pacientemente,
semeaste outras rosas
de uma espécie diferente,
despertando o silêncio.
E a boca, quebrado o feitiço,
murmura incessantemente,
gatinhando escarpas,
alcançando as dunas,
apressa-te, meu amor,
antes que a brisa nos entardeça.

OF- 31-07-14

domingo, 10 de agosto de 2014

Por onde tens andado, EU?

Por vezes reparo no histórico das postagens. Inicialmente, deixava mais partilhas. Tantos momentos que foram eternizados neste espaço! Não diminuiu o ritmo da escrita, tampouco as minhas vivências se tornaram insignificantes.
A verdade é que passei a estar mais ocupada na leitura de escritos, quer em blogues, quer em sites de poesia, como ainda em grupos poéticos na rede social do FB, onde, também, vou alimentando duas páginas. Mas estão magras, coitadas! Consequentemente, a quantidade de postagens no blogue ressente-se. E confesso: frequentemente, tenho dificuldade em escolher o que partilhar…
Este preâmbulo foi apenas um aperitivo para o menu de que vos quero falar, de cariz mais pessoal. Continuei a estar presente em eventos literários (mais espaçadamente nos últimos tempos, pelos motivos que conhecem) a participar em algumas Antologias (prosa e poesia), a estar presente em muitos lançamentos de livros, atividade que deixo registada na página do FB, afim de não sobrecarregar o blogue.
Repescando o título, tive, desta vez, vontade de partilhar convosco alguns momentos, ocorridos recentemente, dos quais vos deixo um apontamento fotográfico.


Amigo desde sempre (Albano Viseu), colega de excelência, no trato e profissionalmente, aceitei, de imediato, o repto para falar do autor e obra publicada, aquando do lançamento da obra “A Simbologia das Palavras” -  os sentidos implícitos nas canções de Zeca Afonso.

Encantado momento literário, abrilhantado pela atuação de colegas cantando algumas das canções alvo de análise na obra. Os presentes pediram bis, no final, acrescentando as suas vozes à canção “Venham mais cinco”.
Uns dias mais tarde, sem falsa modéstia (defeito de que não quero enfermar), soube-me bem, mas mesmo muito bem, o almoço/homenagem com que os colegas do departamento de Línguas e Ciências Humanas e Sociais me presentearam.
 
Emocionei-me? Mais do que isso! Rolaram umas lágrimas cristalinas. Valeu-me não ter posto rímel. Discursei? Não! Falei apenas, nem sei de quê! Orgulho foi ver e sentir que, junto de tantos intervenientes educativos, fui e continuarei a ser uma referência.
Este e tantos outros momentos de reencontro conferem sentido à nossa vida terrena. Pouco a pouco, vou-me desfazendo de dossiês pessoais. Sem qualquer constrangimento. Contudo, se tento fazer o mesmo com os dos alunos, ainda não sou capaz de os enviar para a reciclagem. Até quando? Não sei…
Odete Ferreira – 16-07-2014

(Concluídas as obras, reorganizada a casa, é tempo de passar para o Word o que rabisco no bloquinho e de retomar as visitas aos vossos espaços. Ainda não será com a celeridade que gostaria. O calor amolece e, de manhã, tenho de apanhar uma horita de sol, num resguardado recanto do jardim. Recomendação médica e eu cumpro de bom grado.)