quarta-feira, 25 de abril de 2018

Um dia, foi o dia!


Perdi a conta às escaleiras
que na espera subi e desci.
Adiei o sonho na voragem
das coisas que fazem os dias.
Ignorei o arrepio dos apelos urgentes
das gentes que me são pertença.
Esqueci o frémito dos voos rasantes
entre-os-montes deste granítico reino.
Permiti que as cordas das guitarras
ficassem ressequidas e emudecidas.
Deixei que a voz enrouquecesse
à míngua de frutos frescos e sangue novo.
Escrevi versos de musa
A usurpadores de palavras limpas.

Mas todos os dias me vestia de novo,
trazendo um recital de poesia ao meu povo.
E folhas brancas com palavras desalinhadas.
Nos passos, a leveza de um cântico prometido
e uma nota que não identificava na escala.

Um dia, não precisei de um vestido novo,
tampouco de identificar as notas na escala,
pois novo era então o dia.
E a música que no meu peito ardia!

Odete Costa Ferreira, outubro de 2017
Direitos Reservados
Foto: Mirandela

(Porque é abril em Portugal e porque houve outro abril na minha cidade, com a mudança do poder nas últimas autárquicas, só podia escolher esta data para partilhar este poema.)