terça-feira, 20 de outubro de 2015

Olhares

As primeiras chuvas, por aí. O meu rio ainda não as sentiu mas agita-se em ondinhas a lembrar que precisava de renovar as suas águas, castigadas pela ardência de um sol que endoideceu por estas bandas. E como o compreendo! Apesar de ainda estarmos em pleno verão, respiro airosa na frescura de uma brisa que me faz chegar outros cheiros e outras cores. Cobrem-se os braços mas permite-se que as pernas exibam o tom acastanhado pintado pela sedução dos leitos profusos que os areais oferecem. Disperso-me. Saem devagar as palavras. O olhar acompanha o(s) movimento(s). Há o todo e as partes. É nestas que a curiosidade me faz descarada. Retenho as particularidades visíveis e analiso a atitude. Neste breve encontro de olhares nunca saberei o que o outro pensou da minha atitude. Pelo menos, ter-se-á interrogado da razão do meu olhar ousado. Mas eu sei porque sou assim, quando me sento numa esplanada. As pessoas não são estáticas. Não são paisagem apesar de lhe conferirem significado. São dinâmicas e o espírito dos lugares. Nunca é por acaso que se almoça num restaurante ou se partilha a merenda disposta num murete de xisto. O pensamento até pode enredar-se em estratégias e conjeturas mas, quando se decide, é a qualidade do afeto que prevalece. Ainda bem! Façamos dele a rosa a que podamos os espinhos. Com precisão e com o desvelo da mãe que vigia o sono do seu filho.

Odete Ferreira – 23-08-15
Foto de Odete Ferreira 

12 comentários:

  1. Um excelente texto.
    Obrigada por ter passado pelo Sexta. Permitiu-me segui-la até aqui. Sem saber porquê ou como, no início de Setembro, todos os links se blogues, cujo nome estava acima da letra F, desapareceram da minha sidebar. Venho a recuperá-los desde aí. Levo o seu agora.
    Um abraço

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  2. Boa noite, Odete. Querida, não compreendi o seu comentário na minha poesia " Diálogo com Chronos", rs.
    Não sei se foi um elogio ou uma crítica.
    Também ando com tempo corrido.
    Depois volto com calma, mas sempre agradecendo a sua presença.
    Linda noite.
    Beijos na alma.

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    1. Elogio, claro. Esclareci no teu blogue.
      BJO, amiga :)

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  3. Odete, querida, por aqui também o calor é estarrecedor e a qualidade do ar, inexistente. Soma-se a isso o baixo nível dos rios que, em silêncio, esperam manter o corpo frágil e não se transformarem em terra seca e triste , como já aconteceu com outros.
    Você foi do tempo e da natureza aos seres humanos, com um olhar atento. Realmente, a visão das pessoas a caminhar, a se movimentar, fervilha nossos pensamentos. Mas estamos voltados a gestos e, principalmente, ao que supostamente nos dizem seus olhos. E chegou ao afeto, vínculo que não pode desaparecer. Um belíssimo texto. Bjs.

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  4. A beleza deste teu texto é sublime, Amiga!!
    Um título tão apropriado, "Olhares"...
    Com o teu olhar poético, criativo e curioso (descarado belamente),
    nos permite seguir na caminhada desses registros (teus), sendo
    o olhar de uma árvore com pernas acastanhadas, o olhar do teu
    olhar introspectivo sobre o mundo e pessoas...
    Até chegar bem perto do olhar do afeto:aquele ao cuidar
    de uma rosa e aquele da mãe que vigia o sono do filho.
    E o meu olhar de afeto aqui: lendo, sentindo e apreciando a tua
    escrita que sempre me encanta!...
    Beijinhos.

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  5. A inspiração de uma chuva de Agosto!...Realmente o sol bem precisa de vez em quando, de descanso, e quanto a mim a chuva em Agosto sabe sempre bem, já que o olhar ofuscado pelo brilho do sol, descobre a nitidez de uma opacidade mais real, em que os cheiros tomam primazia.
    Quanto a essa curiosidade descarada em relação às palavras, será inevitável numa pessoa cujo instrumento primordial é a palavra. E as pessoas nunca poderão ser mera paisagem para olhares atentos e uma sensibilidade à flor da pele.
    Gostei muito. Olhares sempre intensamente maravilhosos, por aqui, Odete!
    xx

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  6. Espraias os teus olhares
    Desde o lugar onde estás.
    Quer te quedes ou te vás,
    Tudo aquilo que mirares
    Só te pode trazer Paz.


    Beijo
    SOL

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  7. Olhares intensos sobre a Natureza. Um rio pode começar em nossos olhos e desaguar nesta escrita, tão bela.
    Um beijo.

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  8. Olhares moldados por afectos, sustentados na envolvência das águas do "rio da minha aldeia"...
    Excelente texto, Odete!

    Um beijinho :)

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  9. Odete , como sempre , nos presenteia com textos belíssimos . O bem querer presente em todos os olhares . Beijos e boa semana .

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  10. Um bom texto para amenizar esta entrada no horário de Inverno, que detesto.

    Grato abraço, amiga, e feliz semana

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  11. Lindo e inspirador texto. Uma belíssima semana.

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